3 de julho de 2009

Indócil

Sinapses nervosas.
Arrepios. Sussurros.
Segredos.
Os dedos percorrem o ápice
e o óbvio:
a superfície impalpável dos desejos.
Suor na pele:
O toque,
O truque,
O traço.
Dissimula a troca de pernas,
Insinua os desejos.
Ébria.
No vértice do corpo a vórtice,
Vertigem,
Sossego
E Silêncio.

22 de junho de 2009

A leveza e o peso

Passou a língua sobre os lábios para umidecê-los. Tudo estava no mesmo lugar: a escrivaninha, a cama, a estante cheia de livros... Caminhou devagar, as pontas dos dedos, pendentes, tocaram a extremidade da pequena mesa sobre a qual estavam a velha máquina de escrever, a caneca suja de café, o cinzeiro, papéis, rascunhos... Caminhou até as prateleiras, e observou um por um os livros que estavam ao alcançe de seus olhos. Quantas histórias havia? Gostava de imaginá-las: tocando a lombada de cada livro tentava ler os títulos na penumbra, e assim engendrava as histórias. Ele costumava chamá-la de Lolita quando se conheceram. Tempos depois, foi-lhe explicar o motivo: como a precursora de todas as ninfetas modernas, ela tinha a natureza dupla, a mistura da infantilidade terna e sonhadora com uma espécie de estranha vulgaridade. Era também a labareda em sua carne. Sua alma. Sua lama. Costumava também chamar-lhe de Mon Petit Oiseau, nome que ela se deliciava ao ouví-lo sussurar, imaginando o que poderiam significar aquelas três palavras. Como um pai zeloso, contava-lhe as intermináveis histórias de todos aqueles livros até que ela adormecesse. Mas não eram contos de fadas. Quando ela, fatigada pelos esforços de proporcionar-lhe prazer, semicerrava os olhos prestes a cair num sono profundo, ele repetia uma série de contos sobre mulheres nuas, açoitadas em quartos de paredes vermelhas.
Mas agora ela estava ali, de volta àquele quarto, em frente à mesma prateleira empoeirada. O que havia mudado era ela. O vestido justo, os sapatos de salto, os lábios e olhos pintados, muito negros. E sua inocência? Ela perdera ali, naquele mesmo lugar, mas não no momento em que ele a penetrou sem se preocupar com a dor, sem se preocupar com as lágrimas nem com os protestos dela. Ela perdera o que tinha de belo: a Leveza. Tinha se tornado grave, austera. Perdera a capacidade de se admirar com as coisas ao seu redor.
Mas e ele? Também mudara? O que ela via era o quarto, como uma imagem parada no tempo, congelada. Fotografia desbotada, amarelada como o pequeno facho de luz que penetrava pelo vidro sujo da janela. Teve a impressão que nada ali tivesse sido movido. Nem ele, sentado na cama em meio aos lençóis desgastados. Imóvel. Ele tinha esta capacidade de permanecer; às vezes somente os olhos se moviam para acompanhar os movimentos dela, dos dedos deslizando pela lombada dos livros. A lentidão o irritava. Detestava quando ela tirava a roupa, peça por peça, dobrava, colocava sobre a cadeira, o casaco no respaldo, para não amassar. Não, ele não mudara, continuava o mesmo. O mesmo homem que tomaria o conhaque barato, se despiria sem desabotoar a camisa e a penetraria antes de ela estar completamente pronta, sem se importar com o prazer dela, sem se importar com a dor.
Ele era o contraponto.
Percebera, por fim, que a brutalidade dele fazia com que ela recuperasse a beleza. Era o contraste que a tornava leve. Ele era o peso, a rudeza.
Ela se convencera da suavidade que trazia àquele momento. Então se despiu, fechou as cortinas e antes de se deitar, pegou um livro na estante, a esmo. A insustentável leveza do ser.

31 de maio de 2009

Divagações

Divagar bem devagar,
A passos lentos pela casa.
Ressoar,
Recolher os pedaços.
Desatar,
Desarmar os afetos
(De leve... Bem de leve...)
Escorrer e percorrer os percalços.
Dis - correr
Os passos lentos pela casa
Devagar... Divagar...

26 de maio de 2009

In Media Res #2

E os rostos já não eram os mesmos. E os gostos também. Despercebida, passei. Era só mais uma entre tantos. Rostos rotos. Todos vazios. Mas ainda rostos. (Talvez nem tanto; então, melhor: ainda restos.)
O meu, perdido no espelho, era tão diferente dos outros. Também vazio: Sem-blante. Sem graça.
O que teria sido dele antes? Risos? Mas... e a alegria?
...
E me abandono no eco de minhas palavras vadias. Circulam de boca em boca. A minha profere e profana: Poética, profética palavra.

5 de abril de 2009

Ácido

Ácida.
Sou ácida, meu bem.
Ácido corroendo a boca, quando beijo, quando desejo.
Quando profiro palavras de doer. De matar. Devagar.
Ácido lisérgico. P'ra te viciar. P'ra te enlouquecer.
Te fazer implorar, te fazer explorar o prazer...
Saliva que queima tua pele. Corrói os sentidos.
Lascívia.
Que escorre em tua boca
Ao provares do mel,
Do fel.
Do meu céu
que também é ácido.